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  • Fórmula 1: na prática a teoria é outra
  • Treinos livres mostram que é preciso comprovar na pista as virtudes apontadas pela tecnologia
  • Por Wagner Gonzalez

    Anos atrás a Fórmula 1 permitia a realização de testes livres em qualquer pista e em qualquer época do ano, possibilidade que exacerbava a diferença entre os times de maior e menor orçamento. A McLaren, nos áureos tempos em que era patrocinada quase que exclusivamente por uma marca de cigarros, chegou a revestir o chão de dois boxes em Silverstone para avaliar qual piso seria mais resistente e indicado para ser usado em sua fábrica. Disposta a interromper a espiral de custos que parecia infinita, a Federação Internacional do Automóvel (FIA) e a Associação dos Construtores de Fórmula 1 (Foca, na nomenclatura em inglês) pouco a pouco foram banindo excessos: primeiro foi a proibição do carro reserva, depois veio a limitação do número de motores que cada piloto pode usar durante a temporada, um teto de horas para experiências em túnel de vento e, de quebra, a limitação de testes pré-temporada, algo que estimulou altos investimentos tem computadores e programas sofisticados, principalmente em aerodinâmica.

    Este ano, os dez times inscritos no Campeonato Mundial (Alfa Romeo-Sauber, Alpha Tauri, Alpine, Aston Martin, Ferrari, Haas, McLaren, Mercedes, Red Bull e Williams), passaram três dias da semana passada avaliando seus carros no Circuito da Catalunha, em Barcelona (Espanha), e a partir do dia 10 repetem a dose no Autódromo de Yas Marina, (Bahrain) onde o campeonato começa dia 20 de março. Serão as únicas sessões de testes permitidas até que comece a programação oficial do GP do Bahrein. Nesses dois períodos de três dias de trabalho cada equipe confere na prática a verdade comprada com as indicações de computadores de última geração.

    Cada escuderiadefine suas agendas específicas para conferir se o projeto desenvolvido durante a temporada anterior corresponde ao esperado: resistência, confiabilidade, funcionalidade e velocidade. Por tudo isso é normal que os carros vistos na Espanha vão reaparecer com mudanças no teste de março, algo que vai se repetir nos treinos oficiais para a abertura da temporada. Os fatores que determinam isso vão desde o desempenho no primeiro treino livre, o pouco tempo para fabricar peças de uma solução alternativa, problemas que impediram o correto funcionamento dos carros, adaptação de pilotos recém chegados e por aí afora.

    Em um ano em que o regulamento foi bastante alterado e até os pneus tiveram suas dimensões alteradas – agora são de aro 18” e diâmetro cerca de 70 mm maior -, a análise dos resultados acaba envolvendo variantes inéditas e, consequentemente, dificultando a análise de resultados.

    Simplificando o processo de trabalho pode-se afirmar que o fator quilometragem é um dos indicativos mais importantes desta fase da temporada. Um carro que não quebra ou não apresenta problemas nos seus diversos sistemas ajuda a obter dados mais consistentes de consumo, desgaste e eficiência e contribui para pensar em melhoramentos com mais assertividade.

    Cada escuderia define suas agendas específicas para conferir se o projeto desenvolvido durante a temporada anterior corresponde ao esperado: resistência, confiabilidade, funcionalidade e velocidade.

    No primeiro quesito ninguém foi mais eficiente que Carlos Sainz e a equipe Ferrari: o espanhol completou 236 voltas (24 a mais que Daniel Ricciardo, da McLaren) e a Scuderia 439 voltas, 36 além do total registrado pela Mercedes. O time alemão, porém, cravou os dois melhores tempos do tríduo: Lewis Hamilton registrou 1’19”138 e George Russell, 1’19”233. Ambos usaram o pneu mais macio disponível, o C5, o que demonstra a busca pela performance extrema dentro de um cenário de resistência comprovada.

    O mexicano Sérgio Perez (terceiro mais rápido com Red Bull Honda) fez 1’’19”556 com o pneu C4 e Charles Leclerc foi o quinto mais rápido (1’19”689), porém usando o C3, o que oferece menor aderência entre as três variantes mencionadas. Max Verstappen, que já usou o número 1 – numeral reservado ao campeão mundial em exercício -, marcou o sexto tempo e já deixou claro que isso não o preocupa:

    “Nosso carro andou sem problemas e completei 207 voltas. No Bahrain é tudo diferente e só vou me preocupar com tempos na prova de classificação para o GP”.

    Assim como o holandês, Charles Leclerc também marcou seu melhor tempo com os compostos C3, de dureza média, assim como seu companheiro de equipe, Carlos Sainz. De acordo com Laurent Mekies, o diretor de competições da equipe, a agenda de trabalho foi cumprida:

    ¨Inicialmente focamos em confiabilidade e progredimos para obter parâmetros de desempenho em áreas como aerodinâmica, performance dos pneus e dinâmica veicular. Foi importante que nossos pilotos completassem uma quilometragem significativa pois estamos falando de um carro completamente novo. Agora é voltar para Maranello e estudar a enorme carga de informações que adquirimos em Barcelona”.

    Um dos itens que será estudado pela Ferrari e várias outras equipes com atenção é o fenômeno provocado pela alta carga aerodinâmica produzida pelo efeito solo. Ao criar uma área com menor com menor pressão aerodinâmica sob o assoalho do carro, o fluxo de ar que envolve a parte superior da carroceria força o carro contra o asfalto e aumenta a aderência e a estabilidade. Ocorre que quando essa pressão produz uma distância livre do solo perto do zero tal efeito deixa de existir, o carro perde a estabilidade e o chassi tende a subir. Tal fenômeno acontece em ciclos curtos e torna o carro difícil de ser controlado. Uma situação típica onde as soluções de laboratório não são consolidadas na prática.

    Uma boa surpresa de Barcelona foi a Williams: seus pilotos completaram 347 voltas, dez a menos que a Red Bull e Alex Albon, que retorna à categoria como estreante na equipe, fez o décimo melhor tempo e completou 207 voltas – só Sainz, Ricciardo e Russell andaram mais do que ele. O canadense Nicolas Latifi registrou outras 140. Entre as medições feitas pela equipe uma avaliação de belo efeito plástico: várias ampolas de tinta fosforescente foram instaladas no bico dianteiro e no difusor traseiro para conferir o escoamento de ar em torno da carroceria. Tais ampolas se rompem a uma determinada velocidade e com isso a tinta fica impregnada na carroceria de acordo com os caminhos que o ar percorre em torno do chassi.

    Publicado em 02/03/2022


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